Bilinguismo e Educação Bilíngue – discutindo conceitos

Bilinguismo e Educação Bilíngue – discutindo conceitos

BILINGÜISMO E EDUCAÇÃO BILÍNGÜE –
DISCUTINDO CONCEITOS

1. INTRODUÇÃO
O conceito de bilingüismo e também de educação bilíngüe é complexo e pode envolver várias dimensões ao se definirem.
O objetivo deste trabalho é propor uma reflexão e uma redefinição de bilingüismo e educação bilíngüe. Termos estes que se tornaram não só difíceis de conceituar, mas também sujeitos a definições um tanto quanto divergentes. Para tanto, este trabalho se apresenta dividido em duas partes: na primeira, são discutidos os
diferentes conceitos e as diversas definições de bilingüismo, partindo de concepções unidimensionais como a de Bloomfield (1935), Macnamara (1967) e Titone (1972), em direção a definições multidimensionais como a de Harmers e Blanc (2000); e na segunda parte, é definido o conceito de educação bilíngüe, descrevendo diferentes propostas como a de Harmers e Blanc (2000) e Mackey (2001).

2. BILINGÜISMO

A noção de bilingüismo tornou-se cada vez mais ampla e difícil de conceituar, a partir do século XX. A primeira vista, definir o bilingüismo não parece ser uma tarefa difícil. De acordo com o dicionário Oxford (2000:117) bilíngüe é definido como: “ser capaz de falar duas línguas igualmente bem porque as utiliza desde muito jovem”. Na visão popular, ser bilíngüe é o mesmo que ser capaz de falar duas línguas perfeitamente; esta é também a definição empregada por Bloomfield que define bilingüismo como “o controle nativo de duas línguas” (BLOOMFIELD, 1935, apud HARMERS e BLANC, 2000:6). Opondo-se a esta visão que inclui apenas bilíngües perfeitos, Macnamara propõe que “um indivíduo bilíngüe é alguém que possui competência mínima em uma das quatro habilidades lingüísticas (falar, ouvir, ler e escrever) em uma língua diferente de sua língua nativa” (MACNAMARA, 1967 apud HARMERS e BLANC, 2000:6.).
Entre estes dois extremos encontram-se outras definições, como por exemplo, a definição proposta por Titone, para quem bilingüismo é “a capacidade individual de falar uma segunda língua obedecendo às estruturas desta língua e não parafraseando a primeira língua” (TITONE, 1972 apud HARMERS e BLANC, 2000:7). Outros autores, como Barker e Prys Jones (1998), levantam algumas questões para a classificação de indivíduos bilíngües:

– Devem-se considerar bilíngües somente indivíduos fluentes nas duas línguas?
– São considerados bilíngües apenas indivíduos com competência lingüística equivalente nas duas línguas?
– Proficiência nas duas línguas deve ser o único critério para a definição de bilingüismo, ou o modo como essas línguas são utilizadas também deve ser levado em consideração?
A definição mais comum de bilíngüe é a do indivíduo que fala duas línguas. Entretanto, como se define então, um indivíduo que entende perfeitamente uma segunda língua (doravante L2), mas não possui habilidade suficiente para nela se expressar oralmente? E um indivíduo que fala essa L2, mas não escreve? Devem-se considerar estes indivíduos bilíngües? Devem-se levar em conta auto-avaliação e auto-regulação ao definir quem é bilíngüe? Existem graus diferentes de bilingüismo que podem variar de acordo com o tempo e a circunstância? O bilingüismo deve ser considerado, então, um termo relativo? (BARKER e PRYS, 1998 apud LI WEI, 2000).
De forma semelhante a Barker e Prys (1998), Li Wei (2000) argumenta que o termo bilíngüe basicamente pode definir indivíduos que possuem duas línguas. Mas, deve-se incluir entre estes, indivíduos com diferentes graus de proficiência nessas línguas e que muitas vezes fazem uso de três, quatro ou mais línguas.
Seguindo na mesma direção, Mackey (2000) pondera que ao se definir bilingüismo devem-se considerar quatro questões:

– a primeira é referente ao grau de proficiência, ou seja, o conhecimento do indivíduo sobre as línguas em questão deve ser avaliado. Dessa forma, o conhecimento de tais línguas não precisa ser equivalente em todos os níveis lingüísticos. O indivíduo pode, por exemplo, apresentar vasto vocabulário em uma das línguas, mas, nela
apresentar pronúncia deficiente.

– a segunda questão proposta por Mackey destaca a função e o uso das línguas, isto é, as situações, nas quais o indivíduo faz uso das duas línguas, também devem ser objeto de estudo ao conceituar o bilingüismo.

– a terceira questão levantada diz respeito à alternância de código. Segundo Mackey deve ser estudado como e com qual freqüência e condições o indivíduo alterna de uma língua para outra.

– e, finalmente, deve também ser estudado, para classificação correta do bilingüismo, como uma língua influencia a outra e como uma interfere na outra. Fenômeno este conhecido por interferência. Indo mais além, Harmers e Blanc (2000) ressaltam que não se deve ignorar ofato de que bilingüismo é um fenômeno multidimensional e deve ser investigado como tal. Consideram, assim, importante analisar seis dimensões ao definir bilingüismo: competência relativa; organização cognitiva; idade de aquisição; presença ou não de indivíduos falantes da L2 no ambiente em questão; status das duas línguas envolvidas e identidade cultural. Partindo de cada uma destas dimensões, Harmers e Blanc propõem as seguintes definições:

1 – De acordo com a primeira dimensão proposta, a competência relativa, prioriza a relação entre as duas competências lingüísticas. Obtêm-se, assim, as definições de bilingüismo balanceado e bilingüismo dominante. Considera-se bilíngüe balanceado o indivíduo que possui competência lingüística equivalente em ambas as línguas. Deve ser ressaltado que ser considerado bilíngüe balanceado não significa possuir alto grau de competência lingüística nas duas línguas, mas significa que em ambas o indivíduo em questão atingiu um grau de competência equivalente, não importando qual grau de competência é este. Por bilíngüe dominante entende-se o indivíduo que possui competência maior em uma das línguas em questão, geralmente na língua nativa (doravante L1).

2 – A partir da organização cognitiva, obtêm-se os conceitos de bilingüismo e bilingüismo coordenado. É considerado bilíngüe composto o indivíduo que apresenta uma única representação cognitiva para duas traduções equivalentes. No entanto, o indivíduo que apresenta representações distintas para duas traduções equivalentes é classificado como bilíngüe coordenado. Deve ser enfatizado que um indivíduo bilíngüe pode ser ao mesmo tempo mais composto para certos conceitos e mais coordenado para outros. A distinção feita a partir da organização cognitiva é comumente mal interpretada, posto que esta distinção não se refere a diferentes níveis de competência lingüística, a diferenças entre a idade de aquisição das línguas ou a
diferentes contextos de aquisição. Embora haja uma grande ligação entre o tipo de organização cognitiva, idade e contexto de aquisição, não existe correspondência direta entre a forma de representação cognitiva e idade de aquisição da língua. É verdade, porém, que um indivíduo que aprendeu as duas línguas quando criança no mesmo contexto, provavelmente apresenta uma única representação cognitiva para duas traduções equivalentes. Enquanto que um indivíduo que aprendeu a L2 em um contexto diferenciado da sua L1 pode apresentar representações distintas para duas traduções equivalentes.

3- A idade de aquisição das línguas é considerada de extrema importância, pois afeta diversos aspectos do desenvolvimento do indivíduo bilíngüe, como por exemplo: o desenvolvimento lingüístico, neuro-psicológico, cognitivo e sócio-cultural. De acordo com a idade de aquisição da segunda língua, dá-se o bilingüismo infantil, adolescente ou adulto. No infantil, o desenvolvimento do bilingüismo ocorre simultaneamente ao desenvolvimento cognitivo, podendo conseqüentemente influenciá-lo. O bilingüismo infantil subdivide-se: em bilingüismo simultâneo e bilingüismo consecutivo. No bilingüismo simultâneo, a criança adquire as duas línguas ao mesmo tempo, sendo expostas as mesmas desde o nascimento. Por sua vez, no bilingüismo consecutivo, a criança adquire a segunda língua ainda na infância, mas após ter adquirido as bases lingüísticas da L1, aproximadamente aos cinco anos, conforme aponta Wei (2000). Quando a aquisição da L2 ocorre durante o período da adolescência, conceitua-se este fenômeno como bilingüismo adolescente e por bilingüismo adulto, entende-se a aquisição da L2 que ocorre durante a idade adulta.

4 – De acordo com a presença ou não de indivíduos falantes da L2 no ambiente social da criança que está adquirindo esta língua, classifica-se o bilingüismo como bilingüismo endógeno ou bilingüismo exógeno. No bilingüismo endógeno, as duas línguas são utilizadas como nativas na comunidade e podem ou não ser utilizadas para propósitos institucionais. No bilingüismo endógeno, as duas línguas são oficiais, mas não são utilizadas com propósitos institucionais.

5 – De acordo com o status atribuído a estas línguas na comunidade em questão, o indivíduo desenvolverá formas diferenciadas de bilingüismo. A primeira delas é o bilingüismo aditivo, na qual as duas línguas são suficientemente valorizadas no desenvolvimento cognitivo da criança e a aquisição da L2 ocorre, conseqüentemente, sem perda ou prejuízo da L1. No entanto, na segunda forma de aquisição, denominada bilingüismo subtrativo, a primeira língua é desvalorizada no ambiente infantil, gerando desvantagens cognitivas no desenvolvimento da criança e neste caso durante a aquisição da L2 ocorre perda ou prejuízo da L1.

6 – Indivíduos bilíngües podem ser diferenciados em termos de identidade cultural obtendo-se bilíngües biculturais, monoculturais, aculturais e desculturais. Como bilingüismo bicultural,13 entende-se o indivíduo bilíngüe que se identifica positivamente com os dois grupos culturais e é reconhecido por cada um deles. No bilingüismo monocultural, o indivíduo bilíngüe se identifica e é reconhecido culturalmente apenas por um dos grupos em questão. Deve ser ressaltado que um indivíduo bilíngüe pode ser fluente nas duas línguas, mas se manter monocultural. Já acultural é considerado o indivíduo que renuncia sua identidade cultural relacionada com sua L1 e adota valores culturais associados ao grupo de falantes da L2. Finalmente, o bilingüismo descultural se dá quando o indivíduo bilíngüe desiste de sua própria identidade cultural, mas falha ao tentar adotar aspectos culturais do grupo falante da L2.

De acordo com Harmers e Blanc (2000), deve-se ressaltar que concepções unidimensionais apresentam alguns pontos desfavoráveis, pois estas definem o indivíduo bilíngüe apenas em termos de competência lingüística, ignorando outras importantes dimensões. Outro ponto em que tais concepções são falhas é que estas não levam em consideração diferentes níveis de análises, sejam elas: individuais, interpessoais ou sociais. Finalmente, considera-se o ponto mais discutível dessas concepções o fato de não serem embasadas por teorias de comportamento lingüístico.
Harmers e Blanc (2000) consideram como princípios básicos de comportamento lingüístico: a constante interação de dinamismos sociais e individuais da língua, os complexos processos entre as formas de comportamento lingüístico e as funções em que são utilizados, a interação recíproca entre língua e cultura – auto reguladores que caracterizam todos os comportamentos de ordem elevada – e conseqüentemente a língua
e a valorização que é central para toda esta dinâmica de interação. Concepções multidimensionais não apenas são embasadas nas teorias de comportamento lingüístico, como também levam em consideração noções oriundas de diversas disciplinas: psicologia, sociolingüística, sociologia e lingüística. Conforme apontam Harmers e Blanc (2000), bilingüismo é um fenômeno complexo e deve ser estudado como tal, levando em consideração variados níveis de análises: individual, inter pessoal, inter grupal e social.
Considera-se então, que ao classificar indivíduos como bilíngües ou monolíngües, a dimensão ou as dimensões analisadas para tal classificação devem ser expostas, facilitando, assim, o entendimento não só de quem está sendo classificado, como também de todos que se encontram de alguma forma envolvidos na questão.

3. EDUCAÇÃO BILÍNGÜE
Educação bilíngüe pressupõe conceitos distintos em países e contextos diferenciados em função: de questões étnicas, dos próprios educadores e legisladores e de fatores sócio-políticos. Mackey (1972) alerta para o fato de:
Escolas no Reino Unido nas quais metade das matérias escolares é ensinada em inglês são denominadas escolas bilíngües. Escolas no Canadá em que todas as matérias são ensinadas em inglês para crianças franco-canadenses são denominadas bilíngües. Escolas na União Soviética em que todas as matérias exceto o Russo são ensinadas em inglês são escolas bilíngües, assim como escolas nas quais algumas matérias são ensinadas em georgiano e o restante em russo. Escolas nos Estados Unidos nas quais o inglês é ensinado como segunda língua são chamadas escolas bilíngües, assim como escolas paroquiais e até mesmo escolas étnicas de final de semana…[Conseqüentemente] o conceito de escola bilíngüe tem sido utilizado sem qualificação para cobrir tamanha variedade de usos de duas línguas na educação.(MACKEY, 1972, apud GROSJEAN, F. 1982:213).

Mackey (1972) propõe uma complexa tipologia de programas educacionais bilíngües, abrangendo desde a educação monolíngüe na língua da população de minoria lingüística, à educação bilíngüe em ambas as línguas e também a educação monolíngüe na língua da população dominante. (MACKEY, 1972, apud GROSJEAN, F. 1982:208). Seguindo a perspectiva sociolingüística, Fishman e Lovas (1970) baseiam-se em três grandes categorias para definição de educação bilíngüe: intensidade, objetivo e status.
Dentro da categoria intensidade são identificados quatro tipos de programas bilíngües. O primeiro deles é denominado bilingüismo transicional17. Nele a L1 é utilizada apenas como veículo facilitador na transição para a L2. O segundo programa é denominado bilingüismo mono–letrado. Neste programa a escola utiliza as duas
línguas em todas as atividades, mas a criança é alfabetizada apenas na L2. O terceiro programa é o bilingüismo parcial bi-letrado19 em que ambas as línguas são utilizadas tanto escrita quanto oralmente, mas as matérias são divididas de tal forma que a L1 é utilizada apenas para as chamadas matérias culturais, como: história, artes e folclore; enquanto a L2 é utilizada para as demais matérias. O quarto programa é o bilingüismo
total bi-letrado20 no qual todas as habilidades são desenvolvidas nas duas línguas em todos os domínios.
De acordo com seu objetivo, a educação bilíngüe pode ser classificada em três diferentes programas. O primeiro deles é o programa compensatório em que a criança é instruída primeiramente na L1, visando sua melhor integração no contexto escolar. Osegundo programa é o programa de enriquecimento22, nele, de acordo com Cox e AssisPeterson (2001), ambas as línguas são desenvolvidas desde a classe de alfabetização e
são utilizadas como meio de instrução de conteúdos. O terceiro programa é o de manutenção do grupo23, no qual a língua e a cultura das crianças pertencentes ao grupo minoritário são preservadas e aprimoradas.
A terceira categoria, status, compreende quatro dimensões. A primeira delas é a língua de importância primária versus a língua de importância secundária na educação. A segunda dimensão enfatiza a língua de casa versus a língua da escola. A terceira dimensão é caracterizada pelo contraste entre a língua mais importante no mundo e a língua de menor importância. Finalmente, a quarta dimensão prioriza a relação entre a língua institucionalizada versus a língua não institucionalizada na comunidade. Conforme aponta Fishman (1977), algumas dessas combinações são mais predispostas ao sucesso da educação bilíngüe do que outras. (FISHMAN e LOVAS, 1970, apud HARMERS e BLANC, 2000:189). Indo mais além, Harmers e Blanc (2000:189) descrevem educação bilíngüe como “qualquer sistema de educação escolar no qual, em dado momento e período, simultânea ou consecutivamente, a instrução é planejada e ministrada em pelo menos duas línguas”. Ressalta-se que Harmers e Blanc não entendem como educação bilíngüe programas nos quais a L2 ou a língua estrangeira é ensinada como matéria e não é utilizada para fins acadêmicos. Embora o ensino da L2 possa ser parte de um programa de educação bilíngüe. Também se excluem, não somente os casos em que uma mudança
de código lingüístico ocorre no meio da instrução sem planejamento pedagógico adequado, mas também os numerosos exemplos de submersão24, nos quais crianças freqüentam um programa ministrado na língua nativa de um outro grupo etnológico, tendo sua língua ignorada pelo sistema educacional.
Considerando a definição proposta por Harmers e Blanc, a maioria dos programas de educação bilíngüe se enquadram em uma destas categorias descritas a seguir. Na primeira categoria, a instrução é dada em ambas as línguas simultaneamente. Na segunda categoria, a instrução é dada primeiramente na L1 e os alunos aprendem a L2 até o momento em que estão aptos a utilizá-la para fins acadêmicos. Na terceira categoria, grande parte da instrução é dada através da L2 e a L1 é introduzida num estágio posterior, primeiramente como matéria e depois como meio de instrução. De forma generalista, divide-se a educação bilíngüe em dois grandes domínios:
educação bilíngüe para crianças do grupo dominante e educação bilíngüe para crianças de grupos minoritários. Quando se discute educação bilíngüe para crianças de grupos minoritários deve-se ressaltar que essas crianças freqüentemente vêm de comunidades socialmente desprovidas, como é o caso dos grupos indígenas no Brasil ou mesmo de grupos imigrantes, como os hispânicos nos Estados Unidos. Por educação bilíngüe para crianças do grupo dominante, entende-se uma educação quase sempre de caráter elitista visando o aprendizado de um novo idioma, o conhecimento de outras culturas e a habilitação para completar os estudos no exterior. O estudo aqui apresentado tem como objetivo discutir a educação bilíngüe para crianças do grupo dominante. Obtêm-se então, dois principais tipos de programa: os programas de imersão e as escolas internacionais multilingües.
De acordo com Harmers e Blanc (2000) escolas internacionais multilingües apresentam uma metodologia diferenciada e combinam duas, três ou quatro línguas no programa educacional, por exemplo, a Escola Internacional de Bruxelas, que é destinada principalmente a filhos de cidadãos europeus oriundos de diferentes países pertencentes à Comunidade Econômica Européia. Esta escola é dividida em diversos grupos
lingüísticos. As crianças iniciam a educação primária em sua respectiva L1, se esta for francês, alemão, italiano ou inglês. Se a criança tiver como L1 uma língua diferente destas, deve escolher uma delas para iniciar sua educação primária. Numa segunda etapa uma L2 é introduzida. Num estágio posterior, as aulas são organizadas de modo que as quatro línguas possam ser utilizadas como meio de instrução de conteúdos. Além
disso, Harmers e Blanc (2000) salientam que poucas pesquisas foram até então conduzidas com o intuito de investigar as conseqüências da educação bilíngüe em escolas internacionais multilingües, não sendo assim possível concluir no momento se o sucesso dessas escolas deve ser atribuído a seu aspecto multilingual ou a seu caráter elitista.
O outro modelo de educação bilíngüe descrito por Harmers e Blanc (2000) é denominado imersão. De acordo com eles, imersão significa simplesmente que um grupo de crianças falantes de uma certa L1 recebe toda ou parte da instrução escolar através de uma L2. Grosjean (1982) afirma que em programas de imersão, embora as crianças sejam primeiramente instruídas em uma segunda língua, a língua nativa da criança é introduzida no contexto escolar gradativamente até tornar-se um segundo meio de instrução. Harmers e Blanc esclarecem que os programas de imersão estão baseados em duas hipóteses. A primeira delas é que a L2 é aprendida de modo equivalente ao aprendizado da L1 e a segunda hipótese é a de que a língua é aprendida de modo mais
eficaz em um contexto estimulante, que aprimore as funções da língua, expondo as crianças a formas naturais da mesma.
Ainda de acordo com Harmers e Blanc (2000), existem três tipos de imersão. O primeiro deles, denominado Imersão Inicial Total25, estabelece que toda a instrução dada antes da escola infantil (no Brasil: pré-primário, jardim da infância e maternal) deve ser realizada na L2, o que acontece também nos primeiros dois anos da educação primária, quando as crianças são alfabetizadas nesta L2. A L1 é introduzida gradualmente a partir, aproximadamente, do terceiro ano primário até que o tempo destinado à instrução na L2 seja equivalente ao tempo destinado a L1. O segundo tipo de imersão é conhecido como Imersão Inicial Parcial e difere do primeiro tipo descrito acima, porque as duas línguas são utilizadas como meio de instrução desde o início da vida escolar. Nesse tipo de imersão, o uso relativo de ambas as línguas varia de programa para programa. O terceiro tipo é a Imersão Tardia, designada a alunos do Ensino Médio que receberam, até o momento, instrução tradicional na L2. No primeiro ano do Ensino Médio, 85% das aulas são ministradas na L2 e durante os anos seguintes, o aluno pode escolher e freqüentar 40% das aulas ministradas na L2. No Brasil, a educação bilíngüe para crianças do grupo dominante conquista cada vez mais seu espaço. Segundo a OEBI (Organização das Escolas Bilíngües de São Paulo), a procura pelas escolas bilíngües cresce consideravelmente. Em São Paulo, há
cerca de 25 estabelecimentos da categoria, com estimativa de 2.800 alunos. Há quatro anos, estimava-se que, em todo o Brasil, 25 mil estudantes da pré-escola ao Ensino Médio freqüentassem escolas de ensino bilíngüe.
A segunda parte deste estudo tratou de questões relacionadas ao planejamento da educação bilíngüe e as possíveis conseqüências destas para as crianças. Como Harmers e Blanc (2000) afirmam, a educação bilíngüe é determinada por fatores históricos, sociais, ideológicos, psicológicos e variadas relações de poder. Todos estes fatores devem ser levados em consideração quando se decide pelo modelo ou programa em educação bilíngüe.
Ainda segundo Harmers e Blanc (2000), o fator mais importante na experiência bilíngüe é que ambas as línguas devem ser igualmente valorizadas. Como isto será realizado, deve ser estudado por aqueles que planejam a educação bilíngüe. Uma outra questão que deve ser levada em consideração ao se planejar a educação bilíngüe é a definição dos objetivos, de acordo com o programa que será seguido, e como estes serão
alcançados.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo deste trabalho discutiram-se basicamente os conceitos e definições relacionadas ao bilingüismo e também a educação bilíngüe. Um dos maiores problemas referentes a tais questões é que por causa das divergências nas definições destes conceitos, escolhas e classificações errôneas têm sido realizadas e as conseqüências destas ignoradas ou subestimadas.
Apesar de atualmente a educação bilíngüe e, conseqüentemente, o bilingüismo serem cada vez mais discutidos, diversas das questões apresentadas ao longo deste estudo ainda são ignoradas. Somente por meio de uma compreensão mais ampla sobre o desenvolvimento do bilingüismo, de suas relações com o desenvolvimento cognitivo e também das condições sociais, econômicas, históricas e psicológicas que envolvem a questão, ocorrerá a desmistificação da educação bilíngüe, esclarecendo assim, as diversas possibilidades existentes e suas possíveis conseqüências.

MEGALE, Antonieta Heyden. Bilingüismo e educação bilíngüe – discutindo conceitos. Revista Virtual de Estudos da Linguagem – ReVEL. V. 3, n. 5, agosto de 2005. ISSN 1678-8931 [www.revel.inf.br].

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